Por que quero que seus filhos perguntem sobre minha deficiência

Houve esse momento, há alguns anos atrás, quando eu e dois amigos saímos para tomar um sorvete. Como qualquer outra noite de verão em uma cidade pequena, o lugar estava cheio, então disse aos meus amigos que os esperaria em uma mesa antes que alguém a ocupasse. No caminho até a mesa, vi uma menininha chorando. Não, na verdade, ela estava em prantos nos braços de sua mãe. Quando estava me aproximando da mesa, que infelizmente era bem ao lado dessa garotinha nada alegre, ela gritou “Mamãe! Feia!” e… Apontou-Para-Mim. E simples assim, eles rapidamente guardaram suas coisas e foram direto para o carro.
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Eu não conseguia acreditar. Lá estava eu, cuidando da minha vida e esperando ansiosamente meu delicioso milk-shake que batia no liquidificador quando, impulsivamente, no meio de sua histeria, essa criança diz “feia”. Mas não foi a reação dela que me abalou, foi a de seus pais. Embora a situação tenha sido um pouco extrema e só tenha acontecido uma vez (crianças nem sempre dizem a verdade, certo?), eu sempre lidei com os olhares incessantes e crianças inquisitivas cujos pais não souberam tratar esses encontros de maneira apropriada. Está na hora de mudarmos isso.

Vamos começar falando o óbvio. Eu sou diferente e minha aparência é diferente. Acho completamente normal que uma criança fique curiosa. De fato, acredito que sua curiosidade é algo bom porque sem serem curiosos e nunca perguntando, eles nunca saberão. Dito isto, quando pais apressam seus filhos ao dizerem algo parecido com “Por que ela é assim?” nada de bom virá, pois nada terá sido solucionado. Questões não respondidas frequentemente levam a ideias errôneas e é aí que está o problema. Ao contrário da metáfora, a curiosidade nunca de fato matou o gato.

Embora existam pessoas que, alguns dirão, não lidam bem com essas situações, existem pessoas que sabem exatamente o que dizer para os pequenos e, com o passar dos anos, eu também aprendi a forma apropriada de agir quando crianças fazem perguntas. Se você um dia se encontrar nessa situação, aqui vão algumas dicas:

1. Se você nos vir em público, conversando e interagindo com colegas, a probabilidade é de que ficaremos felizes em responder as questões do seu filho. Fico feliz ao contar a “versão infantil” da minha deficiência, que é “minhas pernas não funcionam e eu tenho que usar essa cadeira bacana para ir aos lugares que quero”. Aprendi que isso funciona bem e que existe a grande possibilidade de a criança passar então a focar na cadeira e não em mim.

2. As vezes, uma criança poderá dizer algo direto a respeito de uma pessoa com deficiência que poderá constranger seus pais, mas é importante não agir de forma irracional. Por exemplo, “Por quê ela é daquele jeito?” ou “Por quê ela é tão pequena?” ou, o meu menos favorito, “feia” são apenas algumas das frases que ouvi no passado. Ao invés de se aborrecer, responda rapidamente seu filho. Mesmo que você não conheça a história da pessoa, um simples “Foi assim que ela nasceu” bastará. Voltando para a primeira dica, se seu filho continuar a fazer perguntas, por que não nos abordar e perguntar? Eu prometo que não mordemos.

3. Crianças aprendem pelo exemplo, então esteja ciente de suas ações. Reações negativas terão consequências negativas como resultado. No entanto, se mostrando positivo e atencioso para respondê-los você ensinará às crianças que é OK se interessar por esse tipo de assunto. Encorajar crianças a perguntar, irá, eventualmente, ensiná-los a serem mais acolhedores e menos preconceituosos a respeito de pessoas com deficiência.

4. Lembre-se que, por dentro, somos como qualquer outra pessoa! Faça perguntas e não tenha receio de nos dizer o que se passa na cabeça do seu filho. Fazer perguntas é como puxar conversa com a pessoa esperando atrás de você em uma fila. Nós iremos contar o que quisermos contar na esperança de elucidar seu filho. A maioria de nós quer ajudar a educar melhor o mundo sobre deficiências e o fato de que nossa deficiência não define quem somos.

Certa vez, saí para almoçar e uma mãe me abordou com seu filho. Ela disse, “Meu filho está me fazendo todo tipo de perguntas sobre você e eu disse que ele poderia lhe perguntar pessoalmente. Você se importa?”. Fiquei extasiada. Mesmo com o garoto logo ficando quieto e tímido, pude lhe dar um pouco mais de clareza sobre minha deficiência e isso foi muito bom. Apenas alguns minutos do meu tempo e suas questões estavam respondidas. Essa é uma criança a menos a se sentir perplexa na próxima vez que uma máquina de quatro rodas passar por ela em público. Eu só posso esperar que mais pessoas façam o mesmo no futuro para ajudar a forma que as deficiências são vistas pelos olhos de uma criança.


O texto de hoje não é de minha autoria. É uma livre tradução de um artigo da Alyssa Silva, uma americana que, como eu, tem Atrofia Muscular Espinhal e tem a mesma opinião que eu sobre crianças e perguntas. Obrigada por autorizar a tradução, Alyssa!

2 Responses

  1. Pedro disse:

    Muito muito bom ler isso! Como pai, aprendi coisas import antes!

  1. 14 de agosto de 2018

    […] POR MARINA BATISTA · PUBLISHED 12 DE MARÇO DE 2015 · UPDATED 23 DE MARÇO DE 2018. Disponível no blogue Rodando Pela Vida […]

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